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As Bençãos de Abraão e Jacó e a Benção de Esaú

Jacó está prestes a encontrar com seu irmão Esaú, depois de vinte e dois anos, para enfrentar o constrangimento que o acompanha desde então.

A narrativa se torna cheia de suspense e apreensão pelo que pode acontecer, Jacó está tomado pelo temor do mal que seu irmão pode lhe causar.

Ele divide sua família e seus empregados em dois grupos, assim pelo menos um poderia sobreviver. Ele envia seus familiares a atravessar o Jaboque, envia presentes a Esaú, dobra seus joelhos e ora. É então que uma das cenas mais dramáticas da bíblia acontece:

“Jacó, porém, ficou só; e lutou com ele um homem, até que a alva subiu. E vendo este que não prevalecia contra ele, tocou a juntura de sua coxa, e se deslocou a juntura da coxa de Jacó, lutando com ele.” Gênesis 32:24-25

É muito enigmática esta luta de Jacó com este homem desconhecido, há um mistério intrigante nesta história. Ela acontece à noite e se estende até o amanhecer, sem nenhuma explicação mais detalhada. Nem ao menos o nome do oponente de Jacó é conhecido.

O texto diz que é um “homem”; o profeta Oséias fala de um anjo; Jacó não tem dúvida, era Deus, e chama o local de Peniel, “porque dizia: Tenho visto a Deus face a face, e a minha alma foi salva” Gênesis 32:30.

O evento que acontece no dia seguinte não é menos surpreendente. A narrativa cria uma atmosfera tensa e imprevisível. Logo nos preparamos para um confronto possivelmente violento. Mas quando Esaú aparece, todo temor de Jacó se mostra infundado.

Ele corre, se lança ao pescoço de seu irmão, o abraça fortemente e chora! Toda raiva, rancor, ou desejo de vingança tinham desaparecido da alma de Esaú, o que era muito compatível com o seu caráter, pois Esaú era um homem dado às emoções apenas momentâneas.

O Reencontro Entre Jacó e Esaú

Agora mais inesperado foi o comportamento de Jacó, antes de encontrar com seu irmão. Ele se inclinou à terra sete vezes, se prostrando diante de Esaú. E todos os membros da família fazem o mesmo, em três repetições significativas.

“E ele mesmo passou adiante deles e inclinou-se à terra sete vezes, até que chegou a seu irmão. Gênesis 33:3… E chegou também Lia com seus filhos, e inclinaram-se; e depois chegou José e Raquel e inclinaram-se.” Gênesis 33:7

É surpreendente também a linguagem que Jacó usa para falar com Esaú. Por cinco vezes ele o chama “adoni”, “meu senhor”. Por duas vezes ele chama a si mesmo de “eved”, “servo” de Esaú. Com este gesto de prostrar-se diante de seu irmão, juntamente com o uso das palavras “adoni” e “eved”, Jacó performava atitudes de auto-humilhação.

Qual seria então a conexão existente entre a humilhação de Jacó, com a luta que se passou na noite anterior? Jacó obteve com certeza, vitória sobre seu “adversário” desconhecido, quando foi por Ele abençoado.

E o novo nome que lhe foi dado, Israel ישראל , ao menos sugere que Jacó não deveria ter dúvidas de sua habilidade de sobreviver a qualquer tipo de conflito. Um homem que “lutou com Deus e com os homens e prevaleceu”, é alguém que não precisava se prostrar diante de ninguém ou chamá-lo de “meu senhor”.

Depois da benção recebida, nós esperávamos por um Jacó mais cheio de triunfal confiança, do que de temerosa humildade.

Contudo, as palavras de Jacó, dirigidas a seu irmão, parecem nos fornecer respostas ao seu notável comportamento. Em princípio, Esaú rejeita os presentes que Jacó lhe oferece, dizendo, “Eu tenho muito [yesh li rav em hebraico] meu irmão; seja para ti o que tens.” Gênesis 33:9.

A resposta de Jacó é enigmática, mas encerra um mistério recebido na noite anterior, quando lutou com Deus:

“Então disse Jacó: Não, se agora tenho achado graça em teus olhos, peço-te que tomes o meu presente da minha mão; porquanto tenho visto a tua face, como se tivesse visto a face de Deus, e tomaste contentamento em mim.

Toma, peço-te, a minha bênção [do hebraico birkhati – que significa literalmente “minha benção”] , que te foi trazida; porque Deus graciosamente ma tem dado; e porque tenho tudo [yesh li khol]. E instou com ele, até que a tomou.” Gênesis 33:10-11

Note que o “presente” para Esaú se torna em “minha benção”. O que Jacó queria dizer com isso? E o que Jacó queria dizer quando toma as palavras de Esaú, “eu tenho bastante”, e as torna em suas próprias “eu tenho tudo”?

Se conseguirmos entender estas palavras, certamente entenderemos a ligação que há entre a luta com o anjo na noite anterior ao subsequente reencontro.

A Benção de Esaú

O rabino Mordechai, no seu livro Pirkei Torah, afirma que aquele que enxerga que tudo o que recebeu de Deus, tem um propósito, para servir a Deus, certamente reconhecerá que “tem tudo” – tudo que necessita para cumprir sua missão no mundo.

Esaú, porém tinha um sentimento de que possuía muito, ou seja, mais do que suas necessidades, pois ele não enxergava a responsabilidade que advém juntamente com as possessões materiais, a obrigação de fazer o bem e a caridade.

Esaú tinha “muito”, sentia assim porque tinha em sobra, já não havia sentido algum em possuir, pois não havia nenhuma missão maior ou espiritual a realizar, era só o ter por ter, possuir por possuir.

Há ainda muitas ressonâncias nesta passagem. A mais significante tem a ver com a palavra panim, “face”. Lembre das emblemáticas palavras de Jacó para seu irmão, “tenho visto a tua face, como se tivesse visto a face de Deus”, que é uma alusão explícita à luta da noite anterior, quando “chamou Jacó o nome daquele lugar Peniel, porque dizia:

Tenho visto a Deus face a face, e a minha alma foi salva.” Gênesis 32:30.

A história se desenvolve, e o desenrolar dos fatos tem algo muito familiar que envolve faces: A face de Esaú, a face de Jacó e a face do próprio Deus. O que estaria ocorrendo, qual seria a mensagem presente nesta camada de interpretação?

A revelação reside no uso, por Jacó, da palavra “benção”. Isso nos leva de volta, vinte e dois anos, a outro momento crucial na história de Israel, quando Jacó, vestido com as roupas de Esaú, rouba a benção de seu irmão.

Interessante constatar que, se por acidente ou intencionalmente, não sei, neste capítulo, Gênesis 27, o termo hebraico b-r-kh “benção”, aparece vinte e duas vezes. Mas vamos aproveitar para aqui relembrar o que constituía esta benção:

Assim pois te dê Deus:

  • O orvalho dos céus;
  • As gorduras (riquezas) da terra;
  • Abundância de trigo e vinho;
  • Sirvam-te povos, e nações se encurvem a ti;
  • sê senhor de teus irmãos, e os filhos da tua mãe se encurvem a ti;
  • malditos sejam os que te amaldiçoarem; e
  • benditos sejam os que te abençoarem. Gênesis 27:29

O sentido destas palavras é muito claro, pois implica em riqueza e poder. Esta é a benção que Jacó roubou, usando as roupas de Esaú, tomando o lugar de Esaú.

As Bençãos de Abraão

E ainda, devemos ter em mente que houve uma segunda benção em Gênesis 28. Esta, ocorreu no contexto de que Esaú tinha se casado com duas mulheres hititas, e “estas foram para Isaque e Rebeca uma amargura de espírito” Gênesis 26:35.

Rebeca aproveitou para enviar Jacó para longe da ira de seu irmão, mandando-o para Arã, onde seu irmão Labão morava. Antes que Jacó partisse, seu pai Isaque o abençoa com as seguintes palavras:

“E Deus Todo-Poderoso te abençoe, e te faça frutificar, e te multiplique, para que sejas uma multidão de povos; E te dê a bênção de Abraão, a ti e à tua descendência contigo, para que em herança possuas a terra de tuas peregrinações, que Deus deu a Abraão.” Gênesis 28:3-4

Esta segunda benção é completamente diferente da primeira. Ela foca em filhos e na terra prometida, os dois elementos-chave que Deus havia prometido a Abraão. Estas são as bençãos de Abraão, as bençãos da aliança que Deus fez com o pai da fé, e que são repetidamente afirmadas no Gênesis e que não têm nada a ver com riqueza ou poder.

Deus prometeu a Abraão filhos que iriam dar continuidade à Aliança, na terra prometida. Deus nunca prometeu que Abraão iria viver no “orvalho dos céus e nas gorduras (riquezas) da terra”, nem usou palavras que indicassem poder, “sê senhor de teus irmãos, e os filhos da tua mãe se encurvem a ti”.

Antes de sair de casa, Jacó recebeu as bençãos Abraâmicas de Isaque, em outras palavras, seria ele quem daria continuidade à Aliança.

A Luta de Jacó

Também é importante destacar que no tempo da primeira benção, Isaque, avançado em idade, já estava cego. Sem poder usar o sentido da visão, ele usa os outros quatro. Prova da refeição, toca as mãos de Jacó (cobertas com pele de cabrito para parecer cabeludo como Esaú), e sente o cheiro das roupas.

“então sentindo o cheiro das suas vestes, abençoou-o, e disse: Eis que o cheiro do meu filho é como o cheiro do campo, que o Senhor abençoou” Gênesis 27:27.

Isaque também ouve a voz de Jacó, “A voz é a voz de Jacó, porém as mãos são as mãos de Esaú” Gênesis 27:22, e dá a Jacó a benção que era de Esaú. Essa personificação de Esaú por Jacó, só foi possível porque seu pai não podia mais ver a sua face.

Esses elementos combinados, são suficientes para que possamos decifrar o mistério que rondava o reencontro ocorrido após vinte e dois anos.

É de se notar que o novo nome que Jacó recebe, “Israel” [Yisra’el], é derivado do verbo לִשְׂרות lisrot, “lutar”. A verdade é que ele passou a maior parte da sua vida em conflito, “lutando” sobre a sua própria identidade.

E em íntima ligação com este tema, estão as palavras “face” (quem eu percebo que sou, quando vejo meu reflexo no espelho?), nome (qual termo, ou qual palavra pode descrever o meu caráter?), e benção (qual destino, ou qual propósito terá a minha vida?).

Na primeira fase de sua vida, Jacó deseja ardentemente ser Esaú. No mínimo, para ser mais específico, ele quer o lugar que Esaú ocupava na família. E luta com seu irmão desde o ventre de sua mãe. Jacó nasce segurando no calcanhar de Esaú (daí vem o seu nome “aquele que segura pelo calcanhar”).

Ele compra o direito da primogenitura de seu irmão. Ele se veste com as roupas de Esaú, e quando Isaque, que não enxergava mais, pergunta quem ele é, Jacó responde, “Eu sou Esaú, teu primogênito” Gênesis 27:19.

E porque ele faz isso tudo? É evidente a resposta de que Esaú é tudo que Jacó não é, ou que não pode ser.

Esaú é o primogênito, quem emerge do ventre de sua mãe, ruivo e coberto de pêlos. Esaú significa, “cabeludo”, depois chamado de Edom, vermelho, cor da terra. Ele é forte, cheio de energia, um habilidoso caçador, um homem do campo, da natureza.

Esaú tem habilidade para o combate e para a conquista. E deposita a sua confiança na batalha, pois é a figura de um guerreiro vencedor. E mais importante, ele é o filho amado de seu pai.

Esaú é o arquétipo herói descrito em centenas de mitos e lendas do mundo antigo, presentes também nos filmes de ação, nos dias atuais. Mas ele é digno, e é um homem bom. Ele não é um homem mau. Ele é um homem natural, e é muito humano, e seu amor por seu pai Isaque é genuino e verdadeiro.

Não me surpreende que Jacó queira ser como ele, pois esta foi a primeira “face” que viu no “espelho” da sua imaginação, a sua primeira referência, a mesma face que ele apresentou a Isaque, quando foi tomar a primeira benção.

Mas aquela face não era a de Jacó, assim como não eram as suas mãos. Nem era aquela a sua benção, não estava destinada para ele. A verdadeira benção, a benção de Abraão foi aquela recebida depois, quando Isaque sabia que estava abençoando a Jacó.

Jacó Devolve a Benção que Roubou

A benção de Jacó nada tinha a ver com riqueza ou poder. A benção falava sobre filhos e sobre a terra prometida. Filhos que deveriam ser instruídos no caminho do Senhor. A terra prometida, onde seria construída uma sociedade, baseada na justiça e compaixão, na lei e no amor. Para receber estas bençãos, Jacó não precisava estar “vestido” de Esaú.

Ao contrário, ele tinha que ser ele mesmo, não um homem da natureza, não um homem natural, mas alguém capaz de ouvir o som que está além de tudo o que é natural, a voz, o chamado daquele que tudo criou, e que não pode ser comprado por riqueza, nem muito menos controlado pela força ou poder humano.

Assim, fica bem claro o que Jacó estava fazendo, ao encontrar com seu irmão, vinte e dois anos depois. Ele estava devolvendo a “benção” que ele tinha roubado por todos esses anos anteriores. Os rebanhos que enviou a Esaú como presente, representava a riqueza (o orvalho dos céus e as gorduras da terra).

As sete vezes que se curvou diante de seu irmão, chamando-o de “meu senhor”, e chamando a si mesmo de “seu servo”, representava o poder (sê senhor de teus irmãos, e os filhos da tua mãe se encurvem a ti).

Jacó não queria e não precisava mais destas coisas, “Eu tenho tudo”, ou seja, “Eu não preciso mais de riqueza ou poder para ser completo”. Isto fica explícito em suas palavras, “Toma, peço-te, a minha bênção”. Agora ele sabe que a benção de Esaú nunca foi destinada a ele, por isso a está devolvendo.

A Verdade Existencial de Jacó

E fica esclarecida também, a luta ocorrida na noite anterior ao reencontro dos filhos de Isaque. Era parte da batalha interior de Jacó, com sua verdade existencial. Quem ele era? Um homem que possuía ardente desejo de ser Esaú? Ou alguém que recebeu o chamado para um destino diferente, a aliança de Abraão?

“Não te deixarei ir se não me abençoares”, ele diz ao seu “amigável oponente”. O desconhecido homem com quem lutava, o dá uma resposta que desafia toda e qualquer expectativa.

Ele não abençoa Jacó de uma maneira convencional, não usa as palavras “seja abençoado”, “você será rico”, “você será forte”, nem promete a Jacó uma vida isenta de conflitos, nada disso.

O nome Jacó, ao longo de sua vida, recebeu a conotação de “luta”. O novo nome recebido, Israel, também significa “lutar”. E há uma reversão, uma inversão na luta de Jacó, e na benção que ele buscava.

Era como se o homem-anjo, estivesse falando pra ele, “no passado você lutou para ser Esaú. No futuro você lutará para ser você mesmo! No passado você segurou no calcanhar de Esaú, no futuro você segurará em Deus. E você não se desapegará de Deus, nem Deus de você. Agora, se desapegue de Esaú, deixe-o ser quem ele é, assim você ficará livre para se apoiar somente em Deus”.

No dia seguinte Jacó faz desta forma. Ele devolve a benção de Esaú, e renuncia à riqueza e ao poder. Na verdade, esta passagem fala de renúncia, da renúncia de Jacó ao materialismo.

“Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me.” Lucas 9:23

A passagem chega a seu final com as palavras, “Vayavo Ya’akov shalem”, “e Jacó emergiu completo”. Esta é a belíssima verdade que Jacó finalmente conclui em sua luta, e que o nome Israel é testemunha: Para sermos completos, nós não necessitamos das bençãos de Esaú, riqueza e poder.

A nossa tem outra face, um destino alternativo, uma benção diferente. A nossa benção é a mesma de Abraão e de Jacó, filhos e a terra prometida.

No campo espiritual, a terra prometida simboliza a nossa pátria celeste, eterna, que preparada está para todos aqueles que vencerem a caminhada da vida, em direção à Canaã celestial. Os filhos são aqueles que advém desta caminhada, na nossa luta para cumprirmos o mandamento do nosso Mestre Jesus de fazer “filhos” na fé, discípulos em todas as nações.

Estas são as bençãos de Abraão, esta é a benção de Jacó, que passou a nós por meio do supremo descendente e Mestre:

“Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” Mateus 28:19

Mas infelizmente, tem muita gente buscando ser Esaú, querendo as bençãos de Esaú, riqueza e poder. Muita gente procurando apoio nas riquezas, buscando poder humano, temporal, político, abrindo portas para que seu coração fique refém destas coisas.

O diálogo ocorrido entre Jesus e o Jovem Rico, mostra como há uma tendência humana em depositarmos a nossa confiança nas riquezas deste mundo, e como são infelizes aqueles que fazem assim. Mas o caminho da salvação não pode ser comprado.

“Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; Mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam.” Mateus 6:19-20

Jacó está prestes a encontrar com seu irmão Esaú, depois de vinte e dois anos, para enfrentar o constrangimento que o acompanha desde então. A narrativa se torna cheia de suspense e apreensão pelo que pode acontecer, Jacó está tomado pelo temor do mal que seu irmão pode lhe causar. Ele divide sua família e seus empregados em dois grupos, assim pelo menos um poderia sobreviver. Ele envia seus familiares a atravessar o Jaboque, envia presentes a Esaú, dobra seus joelhos e ora. É então que uma das cenas mais dramáticas da bíblia acontece: "Jacó, porém, ficou só; e lutou…

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3 comments

  1. Toda palavra de maldição caia por terra em nome de Jesus!

  2. “Eu disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo”. João 16:33

  3. Obrigado !

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